10 perguntas a Rui Carmo (Técnico Alumni)

A Técnico Alumni é uma plataforma que permite aos antigos estudantes do Instituto Superior Técnico reconectar, reviver e relembrar os seus tempos no Técnico através do acesso a uma rede de contactos com outros Alumni. É no contexto das atividades desta plataforma que surge a entrevista a Rui Carmo, ex-aluno do DEI, que hoje republicamos na íntegra.
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Rui Carmo tem 54 anos, licenciou-se em Engenharia Informática e de Computadores (pré-Bolonha), no Técnico, e fez uma pós-graduação na Universidade Católica. É natural de Lisboa, casado e tem 2 filhos. Depois de alguns anos no INESC e na Andersen Consulting, passou mais de quinze anos na Telecel/Vodafone e na Portugal Telecom vivendo (e construindo) o arco de adoção da Internet fixa e móvel em Portugal desde o início. Está há quase uma década na Microsoft (onde desempenha hoje funções de Principal Architect na área de Soluções de Indústria de West Europe), com um percurso sempre em redor de cloud, analítica em grande escala e inteligência artificial.
- Porquê o Técnico?
Era a escolha natural--sempre tive uma afinidade com Informática e Eletrónica (os passatempos do meu pai incentivaram-me muito nesse campo), e quando enveredei pelo Secundário já sabia que o Técnico seria o melhor sítio para prosseguir os meus estudos. Adicionalmente, havia uma conjugação de fatores incontornável: a reputação da instituição, a criação da Licenciatura em Engenharia e Informática e de Computadores e todo um contexto pessoal e familiar (na altura tinha a tremenda sorte de residir junto à Alameda).
- Pode falar-nos um pouco dos seus estudos no Técnico?
Fiz parte da primeira classe a formar-se na LEIC em 1994, o que foi uma experiência bastante única. Lembro-me distintamente da nossa primeira aula, no dia 15 de janeiro de 1990 (1989 foi o ano do exame de acesso geral algo controverso, o que atrasou tudo), e os quatro anos e meio seguintes foram muito intensos, visto que na altura a LEIC estava a ser efetivamente montada em pleno voo. Isso acabou por ser uma espécie de curso de sobrevivência e teve um efeito profundo em todos nós. Foi uma grande lição prática de auto-suficiência e apoio mútuo que forjou amizades únicas.
- Em que atividades extra-curriculares esteve envolvido?
Entrei na Junitec nos primeiros anos, o que me proporcionou uma exposição precoce ao ecossistema de startups (em que ainda estou envolvido hoje), e eventualmente mudei-me para o INESC (e o ecossistema da AITEC) nos anos finais, para mim, era importante ganhar o máximo de experiência profissional enquanto estudava (e também auferir alguns rendimentos), e estas não foram tanto atividades extracurriculares, mas sim uma forma de explorar trajetórias de carreira. E, claro, fui um dos fundadores do “LEIC NEWS”, o jornal (não-oficial e altamente irregular, em várias formas) da LEIC…
- No Técnico, teve alguma figura inspiradora? Quem e porquê?
Havia três influências incontornáveis para quem estava na LEIC, às quais gosto de me referir como o seu triunvirato: nunca precisei de muito incentivo para ser tão direto ou franco como o José Tribolet, mas sempre me esforcei para ser tão ponderado quanto o João Pavão Martins e tão diligente quanto o José Alves Marques. É uma combinação um pouco explosiva, mas olhando para trás, cada um deles teve, à sua maneira, uma influência considerável na forma como abordei a minha carreira.
- Qual é a sua melhor recordação do Técnico?
Há algumas coisas das quais me lembro com carinho, embora talvez não façam muito sentido para as pessoas de hoje, já que todas aconteceram antes da Internet existir—pelo que começo pelas menos importantes: competir por um terminal VT220 livre para trabalhar no VAX do CIIST (e passar demasiadas noites lá), trabalhar com máquinas Apple e NeXT na Junitec (o que moldou a minha relação com computadores até hoje), e as diversas partidas que incluíamos nos trabalhos de grupo—por vezes, terminávamos os projetos e criávamos pequenas surpresas e easter eggs para os professores encontrarem (como um anúncio falso numa tela de boas-vindas). Mas, acima de tudo, tenho ótimas memórias das pessoas, desde pequenos momentos no campus até sessões de estudo pela noite dentro na véspera dos exames a ouvir as mesmas cassetes durante horas. Já se passaram 30 anos e ainda tenho uma playlist de "Trabalho" com as mesmas músicas (embora não todas…)
- Fale-nos um pouco sobre o trabalho que está a desenvolver atualmente
Hoje em dia sou um Principal Architect na Microsoft Industry Solutions, o que significa que sou uma das pessoas mais séniores e que trabalham com clientes-chave (geralmente empresas da Fortune 500) para discussões estratégicas com executivos e liderar equipas que trabalham com eles. Atualmente, isso significa muitas e profundas discussões sobre IA (mais focadas em soluções reais do que hype), mas nos últimos dez anos desempenhei várias funções na Microsoft, principalmente relacionadas com telecomunicações, analítica em larga escala e machine learning. Também faço consultoria para startups e investimentos (e já participei em alguns conselhos de investimento), o que faço essencialmente para manter algum tipo de ligação com a indústria portuguesa.
- Qual foi a decisão mais difícil que alguma vez teve de tomar?
Acho que foram três: A primeira foi ainda no Técnico e significou decidir não me especializar em IA (e optar por SCO e telecomunicações), já que, ironicamente, não via futuro nisso e a Internet estava lentamente a surgir ao nosso redor. A segunda foi não prosseguir com um Mestrado/Doutoramento/MBA em 1994, essencialmente porque precisava de ganhar a vida (eventualmente fiz uma pós-graduação em gestão, mas nessa altura já estava demasiado afastado da academia para considerar voltar). E a terceira foi deixar Portugal "para trás" do ponto de vista de carreira. Tive a sorte de poder continuar a viver em Portugal (e trabalhei alguns anos na Portugal Telecom enquanto o Sapo ainda era "o Google português"), mas a cultura empresarial portuguesa ainda está muito atrás do que vivo diariamente, e por mais que eu gostaria de ter um envolvimento mais direto na indústria nacional, isso torna difícil considerar fazê-lo.
- Atualmente, como é um dia típico para si?
Acordo por volta das 7 da manhã (ou mais cedo), leio as notícias e passo grande parte do meu dia em vídeo-chamadas com equipas de projeto e clientes em vários fusos horários. Tenho muita flexibilidade de horário mas também muita responsabilidade, pelo que chamadas com a Ásia de manhã cedo ou com os EUA às 11 da noite não são raras. Isto significa que posso ter dias bastante longos, mas a maioria das minhas reuniões tendem a ser curtas e eficazes (a maioria dura cerca de 30 minutos) e normalmente tenho pelo menos 2-3 horas de trabalho solo ininterrupto por dia (revisão de documentos ou código, design de soluções, prototipagem, gestão de equipas, etc.), o que me permite ser muito produtivo e ainda terminar o meu dia de trabalho "normal" antes da maioria das pessoas em Portugal. Consigo assim encaixar uma ou duas horas para projetos pessoais, hobbies e algum exercício ao ar livre, se o tempo permitir, mas, mais importante, como trabalho totalmente remoto, tenho muito controlo sobre a minha agenda e consigo priorizar a minha vida pessoal e compromissos de trabalho conforme necessário.
- Que conselhos daria aos estudantes atuais?
A auto-motivação e o trabalho em equipa são cruciais para o sucesso tanto durante como após a faculdade, e o Técnico é o melhor (ainda que por vezes desafiante) lugar para praticar essas competências de vida sob pressão As pessoas com quem vão às aulas podem muito bem fazer parte da vossa vida durante décadas, por isso é essencial encontrar um equilíbrio entre estudo, lazer e crescimento pessoal com pessoas com quem podem eventualmente criar amizades para a vida.
- Que conselhos daria aos estudantes do ensino secundário que estão a pensar em estudar STEM, particularmente no Técnico?
Os mesmos que dou aos meus filhos (que irão para a faculdade daqui a alguns anos): é preciso encontrar o equilíbrio entre o que querem fazer e aquilo em que se destacam, e o Técnico dar-vos-á a oportunidade de o descobrir. As STEM são a base de praticamente todas as grandes indústrias atualmente, e há literalmente centenas de carreiras potenciais. Invistam tempo para escolher aquela que simultaneamente melhor se adapta às vossas capacidades e vos apresenta os desafios mais interessantes, e vai correr tudo bem.
(imagem: Técnico Alumni)